Aurelino dos Santos: A arte do Inconsciente

Analfabeto e pintor autodidata, Aurelino dos Santos ganhou o mundo e hoje tem obras em coleções do Instituto Inhotim e da Fundação Cartier.

Aurelino dos Santos em seu ateliê.

“Há tão somente máquinas em toda parte, e sem qualquer metáfora: máquinas de máquinas, com seus acoplamentos, suas conexões”. É assim que Gilles Deleuze e Félix Guattari começam seu livro “O Anti-Édipo: capitalismo e esquizofrenia”. Nele, os filósofos constroem uma crítica à civilização ocidental e veem como solução convocar conceitos que usamos para interpretar a esquizofrenia e, assim, questionar o status quo e a realidade a nossa volta.

Aurelino dos Santos, artista autodidata e diagnosticado com esquizofrenia, encontra justamente no seu ponto de vista singular as ferramentas para reconstruir a própria realidade.

A VIDA DE AURELINO DOS SANTOS

Aurelino dos Santos nasceu no bairro de Ondina, periferia de Salvador, em 1942. Ainda jovem começou a trabalhar como cobrador de ônibus, mas foi a partir de encontros com o escultor Agnaldo Santos e com Mário Cravo que encontrou sua vocação: a arte. Assim, iniciou sua produção, ainda nos anos 60.

Logo, dos Santos encontrou Lina Bo Bardi, à época a frente do MAM na Bahia, e seu marido, Pietro Maria Bardi, que dirigia o MASP. O casal, impressionado com a arte de Aurelino, o trouxe para São Paulo, onde suas obras começaram a participar de exposições e de galerias. Hoje, seus quadros participam de coleções como a do MAM do Rio de Janeiro, a do Museu AfroBrasil e a da Fundação Cartier em Paris.

O PROCESSO DE AURELINO DOS SANTOS

O trabalho de Aurelino dos Santos expõe a sua relação com os lugares que frequenta. Muitas vezes, seu processo começa com caminhadas solitárias que são levadas para seu ateliê em Ondina. Ele, inclusive, recolhe objetos da rua que são usados como base para as formas nos seus quadros. As paisagens são parte importante de suas obras, mas são representadas de uma maneira completamente original.

A doutora Nise da Silveira, médica precursora do tratamento de pessoas com esquizofrenia a partir da arte, conta em seu livro “Imagens do Inconsciente” que, em casos psicóticos, os sistemas de percepção do mundo interno – a partir do inconsciente – e externo – por meio dos sentidos – se confundem e é a partir da pintura que esse fenômeno se torna visível. O que marca esse processo da pintura é uma busca pela realidade, quando a psique a desestrutura.

O ESTILO DE AURELINO DOS SANTOS

Assim, Aurelino dos Santos constrói suas paisagens sempre em composições muita precisas, que misturam os pontos de vista entre a geometrização e abstração dos espaços. As composições são tentativas de sistematização da realidade.

Ao mesmo tempo, ao geometrizar o universo ao seu redor, Aurelino dos Santos beira a abstração e, na linguagem abstrata criada por ele, constrói novos códigos que falam de sua natureza interior e que não poderiam ser traduzidos para a linguagem convencional.

O que Aurelino faz é reconstruir os seus mundos, internos e externos, a partir da pintura. Um mundo fragmentado e desestruturado. E o efeito em nós, os espectadores, é que voltamos à realidade com um olhar mudado por sua arte

Algumas obras de Aurelino dos Santos e de outros artistas com estilos parecidos estão disponíveis no acervo da Laart. Confira!

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